Carta de apresentação


O SECRETO MILAGRE DA POESIA

Sentimo-nos bem com seu contacto.
Disertamos sobre as suas maravilhas.
Auscultamos pequenas portas do seu mistério
e chegamos a perder-nos com prazer
no remoínho do seu interior.
Apercebemo-nos das suas fragilidades e manipulações.
Da sua extrema leveza.
Do silêncio de sangue e da sua banalização.

Excerto

in Rosa do Mundo

28 de março de 2016

São João da Cruz: Canções de Cristo e da Alma


Um pastorzinho, só, mortificado,
longe está de prazer e de contento,
firme em sua pastora o pensamento
e o peito pelo amor dilacerado.

      Não chora por o amor o ter chagado,
pois não lhe dói assim ver-se afligido,
embora o coração tenha ferido;
chora só por pensar que é olvidado.

      Que só por pensar que é olvidado
por sua bela pastora em dor tamanha
se deixa maltratar em terra estranha,
o peito pelo amor dilacerado.

      E diz o pastorzinho: Ai, desgraçado
daquele que meu amor tornou ausência,
e não deseja gozar minha presença,
o peito por seu amor dilacerado!

      E ao fim de muito tempo, alcandorado
sobre uma árvore, abriu seus braços belos,
e morto assim ficou, suspenso deles,
o peito pelo amor dilacerado.




São João da Cruz
Espanha, 1542-1591
Trad. José Bento
in Rosa do Mundo – 2001 poemas para o futuro
Editor: Assirio & Alvim
photo by Google

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