Uma taça com asas: quem
a viu
Antes de mim? Vi-a
ontem. Subia
Com lenta majestade,
como quem verte
Óleo sagrado: em suas
doces bordas
Meus delicados lábios
apertava:
Nem uma gota sequer,
nem uma gota
Do bálsamo perdi que
houve em teu beijo!
Tua cabeça de negra
cabeleira
-Lembras-te? - com
minha mão pedia,
Pra que de mim teus
lábios generosos
Não se afastassem. -
Serena como o beijo
Que a ti me transfundia
era a suave
Atmosfera em redor: a
vida inteira
Senti que a mim,
abraçando-te, abraçava!
Perdi de vista o mundo,
e seus ruídos,
Sua invejosa e bárbara
batalha!
Uma taça subia pelo
espaço
E eu, em braços não
vistos reclinado,
Atrás dela, nas doces
bordas preso:
Pelo espaço azul eu
ascendia!
Oh amor, oh imenso, oh
artista perfeito!:
Em roda ou em carril
funde o ferreiro o ferro:
Uma flor ou mulher ou
águia ou anjo
Em ouro ou prata o
ourives cinzela:
Apenas tu, só tu, sabes
o modo
De reduzir o Universo a
um beijo!
José Martí
Cuba, Habana 1853 – Dos
Ríos 1895
Trad. José Bento
in Rosa do Mundo – 2001
poemas para o futuro
Editor: Assirio &
Alvim
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